O processo de urbanização reduziu o espaço físico destinado à agricultura, sendo que para Lefebvre (2004), a industrialização dos campos explica os conflitos citadinos. Segundo Santos (1988), a malha urbana se espalhou rápido pelas áreas pobres do globo, o que amplificou a desigualdade. Camarano e Abramovay (2014) chamam a atenção para o êxodo no Brasil, uma vez que a população rural reduziu de 55% para 20% a partir de 1960.
Na perspectiva deste trabalho, considerou-se como empresa social aquela que surge da necessidade comunitária e prioriza os aspectos sociais em detrimento da maximização do lucro. Para tanto, ele precisa se sustentar financeiramente, a sua receita deve vir da produção e, prioritariamente, os seus excedentes devem retornar para a comunidade (Defourny e Nyssens, 2008; Comini, Barki e Aguiar, 2012; Defourny, Hulgård e Pestoff, 2014.
Conforme Mougeot (2005), a agricultura urbana (AU) caracteriza-se pelo cultivo de plantas ou arvores ou a criação de animais dentro de uma área urbana ou em sua periferia. A produção pode ter fins alimentícios ou não, mas precisaria ser direcionada para o mesmo mercado urbano em que foi produzida. Além da produção, a agricultura urbana inclui o processamento e a distribuição dos produtos. Para o autor, a AU deve aproveitar os recursos, serviços e produtos disponíveis nesta área urbana e gerar por sua vez, recursos, serviços e produtos nesta área.
Como são muitas as inciativas relativas à agricultura urbana no país, optou-se por estudar especificamente aquelas em que há a presença da chamada Comunidade que Sustenta a Agricultura (CSA). Este é um sistema de produção agroecológico que consiste na relação direta entre membros de um grupo formado por consumidores e produtores. Os consumidores financiam o plantio e compartilham com o produtor os riscos e, em contrapartida recebem cestas com produtos sem agrotóxicos a preços justos. Este modelo iniciou-se no Japão na década de 1970 e hoje assume formas diferentes pelo mundo (DAROLT, 2012).
Verificou-se que existem aproximadamente 32 CSAs no Brasil e 30 delas surgiram na última década. Em Belo Horizonte, a primeira iniciativa é de 2015. Neste contexto, buscou-se responder à seguinte pergunta de pesquisa: como a empresa social de agricultura urbana, CSA Minas, está se estruturando na região metropolitana de BH? Para isso, analisaram-se as relações desse empreendimento com movimentos sociais, governo, empresas privadas ligadas à comercialização de alimentos, consumidores e cidadãos.
Trata-se de uma pesquisa qualitativa realizada nas duas unidades produtivas da CSA Minas. O método que se utilizou foi o estudo de caso e as fontes de evidências foram entrevistas, observação direta, observação participante e documentos. Para trabalhar os dados, empregou-se a análise de conteúdo e procedeu-se a triangulação para validar os construtos.
Os dados mostraram que o consumidor valoriza a confiabilidade, qualidade, sociabilidade e a autoeducação. O que o faz abandonar a empresa são as finanças e a impossibilidade de escolha. Os agricultores valorizam a garantia, financiamento e o contato direto com o consumidor. Eles declararam que a produção agroecológica é dispendiosa e que o lucro não é sua motivação principal.
Verificou-se também que o governo apoia a atividade e facilita a criação das políticas públicas relativas ao tema. A pesquisa não confirmou ações conjuntas entre empresas convencionais e a CSA Minas e nem competição, mas indicou possibilidade de cooperação. Pelo que se verificou, o volume de negócios destas empresas é pequeno.
A pesquisa permite concluir que a CSA está encontrando o seu espaço na cidade, apesar dos desafios e contradições que vivencia. Embora não haja grande transformação econômica na realidade dos produtores agrícolas pesquisados, os demais atrativos que a pesquisa apontou estão sensibilizando agricultores e consumidores. Com o apoio da comunidade e do governo, a atividade está gerando empregos, consumidores, melhorando a qualidade de vida dos envolvidos e possibilitando ocupar os terrenos urbanos com responsabilidade ambiental.
Camarano, A. A., & Abramovay, R. (2014). Êxodo rural, envelhecimento e masculinização no Brasil: panorama dos últimos cinquenta anos. Revista Brasileira de Estudos de População, 15(2), 45-65.
Comini, G., Barki, E., & Aguiar, L. T. D. (2012). A three-pronged approach to social business: A Brazilian multi-case analysis. Rev. de Administração (SP), 47(3), 385-397.
Darolt, M. R. (2012). Conexão ecológica. Curitiba: IAPAR.
Defourny, J., & Nyssens, M. (2008). Social enterprise in Europe: recent trends and developments. Social enterprise journal, 4(3), 202-228.
Defourny, J., Hulgård, L., & Pestoff, V. (2014). Social Enterprise and the Third Sector: Changing European landscapes in a comparative perspective. Routledge.
Lefebvre, H. (2004). A revolução urbana. Editora UFMG.
Mougeot, L. J. (2005). Neglected issues on form and substance of research on urban agriculture. AGROP.. The social, political and environmental dimensions of UA, 267-279.
Santos, M. (1988). Metamorfoses do espaço habitado. São Paulo: Hucitec, 4.
9. Social and solidarity economy, civil society and social movements